Decisões do Pacto Pela Vida ficarão em sigilo por cinco anos
Para o Governo de Pernambuco, mesmo encaminhamentos com prazo já vencido colocam em risco a segurança da população
Encaminhamentos aprovados com a presença de Paulo Câmara só serão conhecidos no fim do governo do seu sucessor. Entenda mais nesta edição da Catolé.
Dezessete decisões tomadas entre janeiro e maio deste ano pelo comitê gestor do Pacto Pela Vida só serão conhecidas no primeiro semestre de 2026, último ano de gestão do sucessor do governador Paulo Câmara (PSB). A Secretaria de Planejamento de Pernambuco, que coordena o programa de segurança, decretou sigilo sobre os encaminhamentos de 13 reuniões do PPV (cinco delas com a presença do governador). Os documentos haviam sido solicitados por Raphael Guerra, editor no Jornal do Commercio e titular da coluna Ronda JC.
“Meu objetivo era fazer uma análise de quem participava das reuniões, frequência e encaminhamentos. Passaram-se 20 dias (prazo início da Lei de Acesso à Informação), e não responderam. Perto de acabar os dez dias finais (limite da prorrogação do prazo), foi baixada uma portaria restringindo o acesso por 5 anos das informações contidas nos encaminhamentos, sob a alegação de medida de segurança”, conta Guerra.
Na justificativa, o governo afirma que a “divulgação pode prejudicar ou causar risco a planos ou operações estratégicos dos órgãos de Segurança Pública do Estado; comprometer atividades de inteligência, bem como de investigação ou fiscalização em andamento, relacionadas com a prevenção ou repressão de infrações”.
De fato, a legislação estadual prevê a possibilidade de sigilo quando a informação colocar em risco as operações de segurança. O governo, no entanto, classificou todos os encaminhamentos tomados em qualquer reunião como sigilosos. Significa que a aplicação de recursos do Fundo Estadual de Segurança Pública (tema de 04 de março) tem o mesmo risco para a segurança da população do que as medidas para conter crimes com armas brancas (em 18 de fevereiro), na visão do governo. A compra de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) pela Polícia Científica (08 de abril) está no mesmo patamar de ações nas unidades prisionais (13 de maio).
Além disso, todas as atas trazem, ao lado dos encaminhamentos, um prazo para que eles sejam cumpridos. Quando as decisões foram tornadas sigilosas, no dia 02 de julho, todos os prazos estipulados nas reuniões já haviam vencido - o último deles justamente na data anterior, 1º de julho. Confira todas as atas com tarjas nos campos sigilosos aqui.
Raphael recorreu da classificação, alegando inclusive que o sigilo só foi imposto após o pedido de acesso à informação. O pedido foi negado.
“Talvez alguns requerimentos (tenham informações de segurança), sim. Mas, como dá para perceber, as atas trazem informações muito curtas, sem detalhamento. Acho que não quiseram colaborar mesmo. Não é a primeira vez que evitam dar informações. Outra vez, solicitei a lista das delegacias com os respectivos nomes dos delegados titulares. Eles também alegaram medidas de segurança para não fornecer. Recorri, alegando que os delegados são servidores públicos e que a sociedade pode requerer onde os servidores estão lotados. Inclusive porque muitos dos mesmos divulgam onde estão nas redes sociais ou em entrevistas à imprensa autorizadas pelo governo. Aí, eles passaram”, afirma.
Ele vê uma estratégia na atuação do governo. “Antes, eles divulgavam as atas de reuniões do Cemit (Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões), e pararam, por exemplo. Acho que é uma forma de não gerarem pauta mesmo pra imprensa. Porque sabem que, em geral, somos nós que pedimos à LAI”, argumenta.
Com o Pacto Pela Vida também já houve retrocesso de transparência antes. Foi em 2017, não por acaso, quando o número de homicídios em Pernambuco batia recordes às vésperas de um ano eleitoral. O governo mudou a metodologia de divulgação dos números. Os crimes, que há 11 anos eram divulgados diariamente e incluindo, quando possível, o nome das vítimas (medida adotada para dar credibilidade aos índices da segurança pública em uma época em que eles eram amplamente contestados), passaram a só ser divulgados mensalmente, de forma consolidada e anonimizada.
A Secretaria de Planejamento foi procurada por email na segunda-feira (13) para comentar a decisão, mas não respondeu.
Bolsa Base dos Dados: Na última edição, nós falamos sobre o treinamento de jornalistas para trabalhar com dados. Pois a Base dos Dados, um dos projetos de transparência e open data mais legais do Brasil, está com inscrições abertas até esta sexta-feira (17) para bolsas em cursos do Datacamp, uma plataforma de ensino bem completa que, infelizmente, cobra em dólar. O mais legal dessas bolsas é que, além de priorizarem critérios de gênero, raça, orientação sexual e renda, elas também buscam contemplar pessoas de diferentes origens geográficas no Brasil; uma das bandeiras dessa newsletter. Inscrições aqui.